ARTIGO:
“THE MATRIX” E MITOLOGIA —
Uma contribuição da Psicologia Junguiana para se entender o mundo atual
Marcelo dos Santos Ribeiro Cunha
UFMG (2003)
Resumo
Apesar da história da racionalidade ocidental ter-se empenhado em superar os mitos, estes parecem resistir ao tempo. Isso levou alguns autores a crerem que falam de “uma verdade profunda da nossa mente”, guardando a mesma relação com os povos que os sonhos guardam com os indivíduos. Para a Psicologia Junguiana, tais “temas primordiais” mitológicos, recorrentes em culturas diferentes, são chamados arquétipos e constituem rica fonte para análise de indivíduos e sociedades. Dessa forma, o presente trabalho objetiva contribuir para um melhor entendimento do mundo ocidental atual ao analisar motivos mitológicos em voga hoje. A metodologia utilizada é a análise mitológica e simbólica de um filme de enorme sucesso de bilheteria, crendo que tal sucesso não aconteceria sem uma identificação entre público e arte, decorrente da dinâmica do psiquismo coletivo envolvido. O filme escolhido foi “The Matrix”(I) devido seu sucesso e a aparente presença de motivos mitológicos. Pesquisando-se em websites especializados pôde-se fazer um levantamento das informações sobre o filme e seus idealizadores. Para a análise do enredo escolheu-se dois mitos básicos: o herói e o messias. Constatou-se enorme semelhança do filme com a “lenda-padrão do herói” de Otto Rank, e com a trajetória circular dos heróis clássicos, incluindo-se aí os ritos iniciáticos. A personificação do mito do messias foi caracterizada por termos hebraicos, a presença do traidor, dos “apóstolos”, a morte sacrificial seguida de ressurreição e a semelhança com vários trechos bíblicos. Os dados levantados foram confrontados com um panorama da pós-modernidade. A multiplicação coincidente de filmes de super-heróis como “The Matrix” pode estar relacionada com a crise do mundo atual, com sua incerteza e instabilidade angustiantes. O apelo ao messianismo se oporia a secularização e relativismo da nossa sociedade. Ambos fatores denunciam uma fantasia inconsciente de fim mágico para a crise da pós-modernidade e seu “mal-estar”, com uma solução única, clara, personificada, possível e suficiente. Porém, para além da fantasia, tais arquétipos podem também ser modelos inspiradores, falando de uma tendência do psiquismo coletivo a renovação (Neo). O trabalho conclui louvando o trabalho dos criadores desse filme, que ao invés de apenas aproveitarem o alcance dessa arte para fabricarem sonhos lucrativos, propuseram enigmas embasados em boa pesquisa mitológica, o que contribui para a superação da crise mundial através da integração de tendências inconscientes mundiais, expressas nos arquétipos e seus símbolos.
Apresentação oral apresentada no Congresso Nacional de Estudantes de Psicologia (Aracaju, 2003). Orientador: Ms. Paulo José Baeta Pereira.
A Introdução
— os mitos
É muito comum o uso da palavra "mito" com a acepção de mentira, fábula, lenda, invenção. Dessa convenção originou-se a expressão "mitomania".
Esse tipo de relação com os mitos originou-se nos primórdios da construção do pensamento racionalista, com os Pré-Socráticos, quando esses empreenderam dessacralizar o mito grego em nome do lógos, da razão (1). Essa caminhada da construção da racionalidade e cultura ocidentais foi continuamente relegando um papel supersticioso a mitologia, conforme isso interessava os ditames religiosos e políticos das épocas.
Por outro lado, as re-interpretações que foram sendo geradas sobre eles, em especial dos mitos gregos, com a intenção de explicá-los e assimilá-los, por mais que os tenha desvirtuado e camuflado, permitiu que eles conseguissem sobreviver ao tempo — e principalmente à Idade Média — e assim chegassem até nós. De outra maneira teriam se perdido. O alegorismo, o evemerismo e o próprio Cristianismo agiram dessa forma (1).
Somado a isso, as artes plásticas e a literatura gregas, que muito se constituíram com base em sua mitologia, também colaboraram para a perpetuação desse legado. No entanto, perdas e estigmatizações foram inevitáveis.
Segundo SCHWARTZ, temos que:
“No quadro geral das teorias evolucionistas que dominavam o pensamento antropológico do último século, os mitos foram percebidos como a expressão de um esforço intelectual para explicar o mundo, mas também como a manifestação de um pensamento confuso, primitivo, irracional ‘embrionário’, segundo Fraser, ou para Taylor, como ‘elas mesmas resultam o fruto de crenças de uma análise confusa da realidade’.” 2(p. 272)
No entanto, os mitos parecem apresentar uma “persistência secreta”, levando alguns estudiosos a crer que sejam mais do que “uma simples arqueologia da razão” (1, p.34). Roland Barthes os vê como “uma verdade que esconde outra verdade”, e o próprio BRANDÃO, que o cita, redefine isso como “uma verdade profunda de nossa mente”. (1, p.37). Lévi-Strauss vai afirmar que os mitos possuem um caráter essencial por não serem produzidos por mentalidades individuais, mas por se imporem a nós pelo peso da Tradição (2). Ainda em BRANDÃO, este apresenta o mito como “uma representação coletiva (...) que circunscreve e fixa um acontecimento (...) no coração do homem, emotivo como uma criança.” (1, p.36), uma verdade relacionada com as origens do homem, com sua criação. Visto dessa forma, o mito apresenta-se como expressão coletiva da realidade humana, complexa como o real, e ilógica como ele, mas nunca uma mentira.
Reflexões como as trazidas aqui, junto de outras, de muitos outros intelectuais, acabaram por impulsionar uma revalorização do mito. Isso não veio para colocá-lo acima da razão, ou compará-lo a ela, mas sim ajudar-nos a perceber que ele possui uma importância particular, que se mantém viva em nós até hoje.
Nesse sentido, vemos em JUNG (3), que existe um paralelismo entre a estrutura dos mitos e a capacidade de sonhar e fantasiar no homem, em contraposição ao pensamento dirigido. Os primeiros não têm seu interesse no compreender o “como” do mundo real com objetividade e precisão, mas sim adaptá-lo esteticamente às fantasias e esperanças subjetivas. Citando Freud e Otto Rank, Jung vai conceituar o mito como “um sonho coletivo do povo”, “sonhos da jovem humanidade”. (3, p.20,21). Mas de onde viria essa conexão entre o sonhar e o mito? Conforme esse autor, as fantasias dos indivíduos no presente representam a repetição de crenças populares que já foram amplamente difundidas, e que dizem da realização dessas fantasias, quando isso era tido como possível. Assim, aquilo que emerge como sonho hoje, ocultamente, teria sido público outrora, do hábito e da convicção de todos. Dessa forma, o “pensamento-fantasia” ou “pensamento subjetivo” faria ligação do pensamento dirigido com as camadas mais antigas do espírito humano, que há muito se encontram abaixo do limiar da consciência, onde lhe é possível encontrar satisfação. Trata-se do contato com “imagens primordiais, temas mitológicos que freqüentemente reaparecem em contos e lendas populares, de épocas e culturas diferentes” (FADIMAN & FRAGER 4, p.50). Como vemos em JUNG (5), estamos falando dos arquétipos, que habitam o inconsciente impessoal ou coletivo da humanidade, e nosso contato com eles representa verdadeira necessidade humana, assim como o próprio sonhar.
Por isso, Jung alerta-nos para a necessidade do “psicólogo” de “filiar-se a este conceito” (3, p.24), debruçar-se sobre os arquétipos. Os mitos, assim como os sonhos, constituem ricas fontes para a análise de indivíduos e sociedades. E, como toda fantasia, não devem ser tomados ao pé da letra (significante), mas precisam ser interpretados em seu significado, sendo reconhecida a estrutura simbólica a eles inerente. Ao analisá-los, poderemos então perceber tendências da própria personalidade “que ainda não foram reconhecidas ou não são mais admitidas” (p.27). Nesse cenário, os símbolos vão cumprir o papel de auxiliar na conscientização das tendências inconscientes.
Ainda temos em JUNG (3):
“Assim, certamente devem existir mitos típicos que constituem os instrumentos específicos para o estudo dos complexos psicológicos dos povos. Jacob Burckhardt parece ter pressentido isto quando disse que todo grego do período clássico trazia em si um pouco de Édipo, assim como todo alemão tem em si um pouco de Fausto.” (p.28).“... a fantasia do homem moderno no fundo nada mais é que uma repetição de antigas crenças populares, de início amplamente difundidas. (p.22-23).
Tomando por base essas ideias, que o presente trabalho se constitui. O objetivo dessa pesquisa é contribuir para uma melhor compreensão do nosso tempo, através da análise de alguns temas mitológicos que despontaram na atualidade da cultura ocidental. Para tal, qualquer expressão artística que envolvesse o imaginário popular poderia ser analisado. Porém, visando uma abrangência maior dentro de nossa cultura, e conciliando a preferências pessoais, o material estudado foi retirado do campo da cinematografia. Escolheu-se um filme de enorme sucesso de bilheteria mundial, tendo em vista que isso só seria possível se mobilizasse a fantasia de grandes contingentes populacionais da atualidade. Acreditando que esse processo de identificação entre público e arte acontece, em grande parte, de forma inconsciente, e sabendo-se que ele é, também, muito corroborado pelos motivos mitológicos que estão em jogo (daí a influência sobre as massas, através do inconsciente coletivo), objetiva-se fazer uma análise mitológica da obra escolhida, tentando, assim, entender melhor o psiquismo coletivo que possibilitou tal sucesso. Objetiva-se saber quais são as fantasias inconscientes que esse “sonho coletivo” fabricado conseguiu satisfazer, e o que suas “imagens primordiais” podem estar nos informando sobre tendências inconscientes da sociedade ocidental atual “que ainda não foram reconhecidas ou não são mais admitidas”.
O filme
“The Matrix” é uma produção americana de 1999, recorde mundial de bilheteria (US$ 460 milhões) e ganhador de 4 Oscars. Produzido pela Warner Bros., e idealizado pelos irmãos Larry e Andy Wachowski, esse sucesso cinematográfico tornou-se o primeiro de uma trilogia milionária, cujos episódios seguintes estão sendo lançados neste ano. “Matrix Reloaded”, o segundo da série, teve lançamento mundial em 15 de maio, chegando ao Brasil uma semana depois, e alcançando a marca de de US$ 113,2 milhões - cerca de R$ 337,5 milhões - em sua segunda semana de exibição. A quantia foi calculada a partir das bilheterias de cinema em 62 países fora dos Estados Unidos. É a primeira vez que um filme ultrapassa a marca dos US$ 100 milhões na segunda semana de exibição, batendo “O Senhor dos Anéis: as duas torres”, e perdendo apenas recentemente, em bilheteria, para a comédia de Jim Carrey: “Todo Poderoso”. A última parte da série, “Matrix Revolutions”, terá lançamento mundial em 7 de novembro próximo. A produção dos dois últimos filmes da trilogia custou, ao todo, US$ 300 milhões (cerca de R$ 894 milhões), tendo sido rodados simultaneamente em 200 dias de gravações. Os lançamentos dos dois, nos cinemas americanos, foram marcados com a diferença de 6 meses entre eles. Ambos os filmes levaram 4 anos para serem concluídos, entre pré-produção, filmagens e pós-produção. Além desses 3 filmes, nove capítulos de curtas de animação compõem a série Animatrix, uma fusão inédita da tecnologia CGI com os “animés” japoneses, que consumiu mais de três anos em estúdios no Japão, Coréia e Estados Unidos. Também em 15 de maio, a Infogrames/Atari lançou mundialmente o game “Enter The Matrix”, roteirizado pelos diretores do filme, para PC, Playstation 2, Gamecube e Xbox. Todos esses números permitem-nos vislumbrar um verdadeiro universo construído por esses filmes, que conta também com páginas na internet e fã-clubes por todo o mundo, denotando verdadeira comoção mundial. (6,7,8,9,10,11)
Adaptado da web site “Adoro Cinema”(8):
Ficha técnica
Título Original: The Matrix
Gênero: Ficção Científica
Tempo de Duração: 136 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 1999
Site Oficial: www.whatisthematrix.com
Estúdio: Village Roadshow Productions
Distribuição: Warner Bros.
Direção: Andy Wachowski e Larry Wachowski
Roteiro: Andy Wachowski e Larry Wachowski
Produção: Joel Silver
Música: Don Davis
Direção de Fotografia: Bill Pope
Desenho de Produção: Owen Paterson
Direção de Arte: Hugh Bateup e Michelle McGahey
Figurino: Kym Barrett
Edição: Zach Staenberg
Efeitos Especiais: Mass. Illusions, LLC / Manex Visual Effects / Amalgameted Pixels
Elenco
Keanu Reeves (Thomas A. Anderson/Neo)
Laurence Fishburne (Morpheus)
Carrie-Anne Moss (Trinity)
Hugo Weaving (Agente Smith)
Gloria Foster (Oráculo)
Joe Pantoliano (Cypher)
Marcus Chong (Tank)
Julian Arahanga (Apoc)
Matt Doran (Mouse)
Belinda McClory (Switch)
Ray Anthony Parker (Dozer)
Sinopse
Thomas Anderson (Keanu Reeves) é um jovem programador em 1999. Ele trabalha para uma grande empresa de tecnologia, vive em um pequeno apartamento escuro, e tem uma vida que seria totalmente comum, caso não fosse sua identidade virtual Neo, e suas atividades no seu tempo livre como hacker. Sua vida tem sido angustiada por dúvidas sobre o que é a realidade, e hackers que lhe interceptam pelo computador prometem-lhe responder suas dúdivas. Por meio do encontro com os misteriosos Morpheus (Laurence Fishburne) e Trinity (Carrie-Anne Moss), Thomas descobre que é, assim como todas as outras pessoas do mundo, vítima do Matrix, um sistema computacional que manipula a mente das pessoas, criando a ilusão de um mundo real enquanto usa os cérebros e corpos dos indivíduos para produzir energia. Essa realidade fictícia foi criada pelas máquinas, que possuidoras de IA (inteligência artificial), voltaram-se contra os seres humanos e dominaram o planeta. Diante desse conflito, Morpheus está convencido de que Thomas é Neo, o profetizado messias, capaz de enfrentar o Matrix e conduzir as pessoas de volta à realidade e à liberdade.
Premiações
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Ganhou 4 Oscars: Melhor Edição, Melhores Efeitos Sonoros, Melhores Efeitos Especiais e Melhor Som.
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Recebeu uma indicação ao Grammy, como Melhor Trilha Sonora.
Entre vários fatores, um que levou à escolha de “The Matrix” para a realização desse trabalho foi a presença clara de motivos mitológicos em seu enredo. Além disso, sua história apresenta dificuldade de compreensão bastante superior, se comparado aos filmes comuns de Holywood — o que, paradoxalmente, não atrapalhou seu sucesso nem sua continuação. “The Matrix” acabou por se tornar num apaixonante enigma que envolveu grandes multidões, fazendo milhares de pessoas se perguntarem e discutirem sobre o filme após assisti-lo (o que fica comprovado pelos chats de discussão que foram criados para isso. Ex.: www.matrixbrasil.com.br). Fica claro que tal fato só poderia ter sido impulsionado por motivos inconscientes, acionados, também, pela mitologia envolvida. Do contrário, teria se tornado apenas mais um filme chato e difícil, e não essa comoção milionária. Com as pesquisas desse trabalho, descobriu-se que os criadores do filme possuem bom conhecimento de mitologia, justificando as suspeitas deste trabalho.
A Análise
O site Cine Pop (9) conta-nos que os idealizadores da saga Matrix, Andy and Larry Wachowski, desenvolveram suas carreiras de roteiristas explorando idéias que desafiam as atuais percepções da realidade. Matrix surgiu da literatura não-convencional que leram e escreveram, bem como do antigo interesse e conhecimento em mitologia clássica e lendas. Os próprios irmãos dizem, por esse site, que: "Acreditamos realmente na importância da mitologia e na forma como ela explica a cultura". A isso, somam suas reflexões sobre a revolução tecnológica no mundo, com seus aspectos positivos, negativos, e, principalmente, totalizadores. Andy Wachowski completa: "Durante a história do mundo existiram pessoas que buscaram o significado profundo da vida e chegaram a revelações surpreendentes. Neste filme queríamos mostrar o que acontece a um pequeno grupo de pessoas que fazem perguntas que têm respostas muito estarrecedoras. Queríamos que as descobertas deles fossem o começo da história, não o fim; estávamos interessados no que essas pessoas fariam à medida que ficassem mais conscientes com o que aprenderam". Mitologia, paralelo com a realidade, enigma, caminho de conscientização, é com isso que estamos lidando ao analisar “The Matrix”. As vias de interpretação são inúmeras. Aqui tentamos nos basear, principalmente, na análise dos motivos mitológicos em jogo. Escolhemos alguns dos muitos que poderiam ser listados, compreendendo aqueles que mais chamaram a nossa atenção.
Herói
Não há dúvidas de que esse filme de ficção científica conte a saga de um herói na sua luta por libertar os seres humanos de um destino fatalístico — no caso, Neo, contra a prisão virtual constituída por Matrix. Esse é um dado comum aos filmes de ficção americanos. No entanto, é interessante observar mais profundamente esse enredo, podendo então perceber os elementos mitológicos que constituem a identidade dos heróis, e que estão presentes nessa história.
Para tanto, BRANDÃO (12) será nosso guia. Conforme esse autor nos informa, etimologicamente a palavra herói vem de “héros”, do grego, próximo de “servare”, do latim, significando “o guardião, o defensor, o que nasceu para servir” (p. 15). Com base na “lenda-padrão” do herói, por Otto Rank (p. 20), sabemos que, normalmente, o herói tem sua chegada prenunciada por um oráculo, e seu aparecimento é seguido de perseguição e perigo, pois há autoridades que o vêem como uma ameaça. Assim, ele tem de ser recolhido e salvo, para que espere o momento certo de entrar em ação. Antes disso, ele já dá mostras de sua natureza e condição superiores. Dele é esperado a capacidade para a “transgressão dos limites e medidas que os deuses não permitem sejam ultrapassados pelos mortais” (p. 19), o “métron”. Quando ele faz isso, acaba se descobrindo herói, e então realiza suas façanhas memoráveis. Depois disso, regressa para os seus, possuindo “energias suficientes para ajudar e outorgar dádivas inesquecíveis a seus irmãos” (p. 23). Existem ainda outras características que identificam o mito do herói. Talvez algumas mais possam ser percebidas nesse filme. Mas o interessante é observar como as já listadas são tão detalhadas para descrever a ficção escolhida, estando todos presentes nela.
Morpheus, após dar a pílula vermelha a Thomas Anderson, conta-lhe que apenas o libertou da ilusão de Matrix por crer que ele seja “The One”, aquele que o oráculo profetizou ter nascido para vencer a Matrix (isso, por volta do min. 43). Ele acredita que ele será capaz de superar até mesmo os agentes, coisa impossível para os demais mortais. Quando Thomas é descoberto pelo grupo de Morpheus, isso é acompanhado de perigo, pois os agentes desconfiam dele e o prendem (aprox. min 15). Mas eles não sabem ainda de sua natureza. Trinity diz: “If they knew what I know, you would probably be dead (21’45). Mas essa personagem o recolhe e salva a tempo, tirando dele o “grampo” que os agentes lhe implantaram. Enquanto se prepara para sua missão, Neo já demonstra superior capacidade nos “sparring programs” (min 48 em diante), como na aprendizagem das habilidades de luta. Faz o mesmo enfrentando um agente: “You move like they do. I´ve never seen someone moving that fast”, diz Trinity (1:46’48). E no fim do filme, quando ele volta da morte e vence os agentes, descobre que realmente é “The One”. Então se tem a última cena, com Neo pronto para vencer Matrix (“system failure”) e libertar a humanidade.
Nessa história podemos perceber ainda a trajetória circular do herói, em termos clássicos: a separação (com sua saída do mundo comum), a iniciação (com seu treinamento e o enfrentamento dos agentes) e seu retorno (cena final). Como todo herói, sua iniciação compreende uma educação, que o ajudará com a “timé” (honra) e “areté” (excelência), preparando-lhe para “suas magnas tarefas” (p. 25). Nisso temos os ensinamentos de Morpheus e os softwares de educação de habilidades.
Ademais, podemos ver ainda, no primeiro contato de Morpheus com Thomas e nos sofrimentos que lhe sucedem após ingerir a pílula vermelha, seu rito de passagem. E nesse ínterim, nem dos ritos iniciáticos do “corte de cabelo” e da “mudança de nome” (p. 28) o filme se esqueceu. No min. 35 Thomas, após ser dragado para o barco, entra para o “real world” sem cabelos. E, embora, desde o começo do filme ele já tivesse o “nickname”, é a partir desse momento que ele só será chamado por Neo, não aceitando mais seu velho nome:
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The sound of your death, Mr. Anderson! – diz o agente.
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My name is Neo! – falando isso, ele escapa do seu adversário (por volta de 2h de filme).
Isso denota a “metanóia” completa do herói (p. 41).
Mas esse filme não apresenta-nos um herói qualquer. Esse personagem, além dos definidos traços clássicos, ainda carrega uma característica muito importante e peculiar: o messianismo.
Messias
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You are my Jesus Christ – diz um cliente de Thomas, ao comprar dele um material de contrabando digital (8’35).
O messianismo é um tema mitológico que marcou várias religiões do mundo, desde as mais antigas, mas que se consagrou na cultura ocidental através do Cristianismo. É o padrão do “jovem deus que morre e ressurge”, encontrado também entre os persas mulçumanos, os antigos sumérios, e os índios americanos modernos (MOORE & GILLETTE 13, p.10).
Como podemos ver na TEB (14, p. 1842), os acontecimentos que levaram à destruição de Jerusalém até o ano 0 de nosso tempo fizeram os judeus ansiarem cada vez mais por uma intervenção divina que pusesse fim ao sofrimento deles, e a dominação romana. Para tal, diversas crenças se desenvolveram na Palestina, longe de constituírem uma unidade coerente. Dentre elas, começou-se a cogitar um messianismo judaico, o que não era claro nem previsível na tradição até então, e nem era incentivado pelas autoridades do Templo. Nesse cenário, o messias era esperado como um ser dotado de poderes sobrenaturais, associado mais ao espiritual do que ao terrestre (político e econômico, como David). Constituiu-se num grito dos pobres e desesperados, que acabaram por vê-lo encarnado pela trajetória de Jesus Cristo, história que todos conhecemos.
O ponto que nos interessa é vermos as semelhanças nítidas entre o expoente do messianismo ocidental e o filme “The Matrix”.
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You are here to save the world! – diz Cypher a Neo (1:02’24).
Além de ter seu aparecimento profetizado, como já dissemos, Neo também é cercado por um “Judas” dentre os “apóstolos”.
Na bíblia, em Mt 10,21 temos nas falas de Jesus que: “o irmão entregará a morte seu irmão, e o pai, o seu filho (...)”. E em Mt 26,21b: “Em verdade, eu vos digo, um de vós me vai entregar”. Esse tema aparece fielmente no filme. A história começa com os agentes quase capturando Trinity, porque “the line was traced” (min. 3). Após esse fato, eles dizem: “the informer was real”. Era Cypher, que estava em contato com eles para ajudá-los a dirimir a Resistência.
Num encontro que nos lembra bastante o de Judas com os sumos sacerdotes (Mt 26, 14-16), Cypher combina o preço da delação com os agentes. Como JUNG (3) nos alerta, a lenda de Judas é um tema típico: do herói traído friamente por um dos seus próximos, sem chance de combate. Isso ocorreu entre “Siegfried e Haden, Balder e Loki, (...) César e Brutus” (p. 26-27), e remonta a própria história da inveja humana.
Achado interessante é que Cypher, com esse ato, entrega Morpheus e não Neo. Ao que parece, esse mito é encarnado por esses dois personagens do filme, sendo Morpheus o líder dos “apóstolos”, que é capturado para ser interrogado e “crucificado”. Já Neo é o “messias” profetizado, dotado dos poderes sobrenaturais para libertar os humanos, e que passa pela “ressurreição” ao final do filme, após sua morte sacrificial. Tal divisão deu plausibilidade ao enredo, ao mesmo tempo em que personificou detalhadamente o mito.
Quanto aos “apóstolos”, quando Morpheus apresenta a sua tripulação a Neo (aprox. min. 37), temos essa impressão. São em 7, que é um número chamado perfeito, assim como o 12 e o 5. Como vemos em FURLETTI (15), esse número representa a totalidade, como também renovação, recriação do mundo, fazendo alusão aos 7 dias da criação.
O tema da “ressurreição” é nítido no fim do filme. Neo morre literalmente, mas, movido pelo amor de Trinity, ele retorna, glorioso, capaz das façanhas às quais foi predestinado. Vence a morte, “porque não era possível que a morte o retivesse em seu poder” (At 2,24b). Depois disso, faz seu discurso final, prometendo libertar toda a humanidade.
Morpheus, aos 53’29 minutos diz: “Neo, you have to let all go. Free your mind.” E Neo, em 1:35’39: “Morpheus believed in something. And he was ready to give his life for what he believed. I understand that now. That’s why I I have to go.” E quando Neo começa a enfrentar o agente Smith, Morpheus fala: “He’s begining to believe”. Toda essa fé vem bem ao encontro de trechos como esse: "Não temais os que matam o corpo, mas não podem matar a alma, temei muito mais aquele que pode fazer perecer a alma e o corpo na geena." Outro trecho que lembra o Cristianismo é uma explicação que Morpheus dá a Neo, dentro da simulação da Matrix: "If you are not one of us, you´re one of them", se o comparamos a Mt 12,30: "Quem não está comigo está contra mim, e quem não ajunta comigo, dispersa".
Outros aspectos que fazem alusão à crença cristã são os próprios nomes de origem hebraica, como Nabucodonosor e Sião. Esse último, no filme, é o nome da última cidade humana na Terra (46'50). Como podemos ver na TEB (14 - índice analítico), Sião é o nome do monte sobre o qual David decide fazer a capital do seu reino, Jerusalém, a "cidade de David". Sua posição geográfica especial garantia a independência necessária ao soberano. Tomada dos canaanitas iebusitas, é tida pelos judeus como a cidade "escolhida" por Deus, onde fica o Templo. Não fazia parte do território de nenhuma das tribos israelitas até então. Com o exílio na Babilônia, acreditava-se que dos poucos sobreviventes que lhe restaram se ergueria de novo a nação Israelita (2Rs 19,30-31). O profeta Ezequiel vai ver o exílio como um castigo a Jerusalém, que tinha origem pagã, e com isso paga por sua infidelidade a Deus. Ele teria deixado Sião. É a queda de Jerusalém. Mas o próprio profeta vai falar do "resto" irrisório, reduzido a cadáveres, que revigorarão. Mortos que viverão, "um povo que voltou à vida, mas a uma vida totalmente diferente da anterior" (p. 806) . "Porei nervos sobre vós, farei crescer carne sobre vós", "eu vou abrir vossos túmulos, farei-vos sair de vossos sepulcros, ó meu povo, reconduzir-vos-ei ao solo de Israel (Ez 37,6a.12b). Essa imagem é bem semelhante ao despertar de Neo no filme (min. 31 em diante, e também 42'30). Na bíblia, esse trecho de Ezequiel trata da intervenção escatológica do Senhor, que fará a libertação de Seu povo no tempo em que ”o sol e a lua escurecem e as estrelas escondem seu brilho" (Jl 4,15), partindo de Jerusalém, o "umbigo da terra" (Ez 38,12). É nessa cidade que Cristo, mais tarde, cumpriria essa profecia com sua morte e ressurreição.
Coincidência ou não, a Sião do filme fica "deep underground, near the Earth´s core, where it´s sill warm" (46'50) — local privilegiado onde os humanos puderam refugiar-se das máquinas. E a Terra, no filme, é toda sombria, pois o Sol foi destruído (min. 42).
A Discussão
Parece que aquela “persistência secreta” dos mitos pode ser percebida nesta obra de ficção. Num artefato clímax da nossa pós-modernidade hi-tech pudemos perceber tantos símbolos mitológicos, que isso só poderia ser possível graças a essa persistência sobre-humana. Ou então uma maior se faria mister, de uma inventividade quase alucinatória (a deste trabalho). A bem da verdade, poderia se imaginar também que tudo isso não passou de um heróico trabalho pré-determinado de criação de roteiro. Mesmo que isso seja possível, tal fato não explicaria como a criação de um enigma tão mirabolantemente intrincado tornar-se-ia o motivo de tamanha adesão mundial, ao invés de mais um filme chato e complicado.
Acreditando que essa persistência se justifica, já bastante documentada por antropólogos e estudiosos dos mitos, poderíamos dizer que ela fala do que é próprio do humano. Tantas civilizações, em tantos tempos e espaços diferentes, deram-nos indícios para pensar que onde existem homens existem mitos. E estes se comunicam, de alguma forma. Parecem falar da humanidade, num campo onde palavras são insuficientes, e raciocínios explicativos, estéreis. Um campo onde os símbolos são os melhores instrumentos, capazes de mediar o encontro entre o profano e o sagrado (2), o consciente e o inconsciente, o pessoal e coletivo (3), o passado e o futuro — o que bem faz jus à etimologia da palavra “symbolon”. Relacionando-se mais com a fantasia e a metáfora do que com a análise e a teoria, os mitos abrem uma estrada para infinitas interpretações. O presente trabalho escolheu uma, com prós e contras, sabendo que outras ainda são possíveis, e todas, necessárias nesse processo do “decifra-se ou te devoro”.
E nesse processo, a indústria cinematográfica vem bem a calhar. Ao fazer seus sucessos para si, presenteiam-nos com telas que se tornam “espelhos”, permitindo-nos fazer uma psico-análise onírica dos nossos “sonhos coletivos fabricados”. (Afinal de contas, colocar esse bando de gente num “divãzão” seria bem difícil).
Para entender um pouco melhor as tendência inconscientes coletivas representadas pelos mitos de “The Matrix”, é bom que nos voltemos primeiro para nossos “restos diurnos”.
De um lado temos a sociedade contemporânea, marcada pela complexidade, desigualdade e crise, em todos os seus níveis. BAUMAN (16) fala-nos muito bem desse cenário em seu “O mal-estar na pós modernidade”. A instabilidade e a incerteza são as normas gerais, o medo do outro e o mal-estar, algumas das conseqüências. Do outro lado temos uma pululação de filmes de um mesmo estilo, nas telas mundiais nessa virada de milênio: “Guerra nas Estrelas” (episódio I, II e III), “O Tigre o o Dragão”, “Senhor dos Anéis” (3 filmes), “Harry Poter” (3), “As Panteras” (2), “Homem Aranha” (2), “Hulk”, “Todo Poderoso”, etc.; como também a trilogia Matrix. É certo que possuem diferenças consideráveis entre si, mas as semelhanças nos fazem colocá-los num mesmo grupo, relacionando-os com a lógica de histórias em quadrinhos e livros infantis (Matrix possui o “Animatrix”), todos tematizando ficções com heróis e superpoderes. Ora, com alguns sendo mais realísticos, ora mais mirabolantes, todos trabalham a re-invenção da realidade e suas regras. É verdade que esse estilo de filme já havia antes, com os “007’s”, ”Super Homem’s” e “Batman’s”, mas o curioso é perceber a multiplicação deles na atualidade, com formas diferentes, todos ao mesmo tempo, e de enorme sucesso de bilheteria. É como se os cineastas tivessem percebido um filão de mercado e saíssem vários atrás dele. Mas que filão é esse?
Sabemos por JUNG (3), que os mitos possivelmente foram crenças amplamente difundidas no passado, para onde nossa fantasia inconsciente submerge, buscando sua satisfação. Representando tendências “não reconhecidas pela personalidade”, acredito virem ao encontro da crise do mundo atual. Essa, apesar de ser estudada e discutida em alguns centros de pesquisa, atinge o grande público sem que esse tenha, normalmente, instrumentos teóricos que lhe permitam conscientizar-se dela ou refleti-la. Sendo veiculada pela mídia e pelos poderes representativos, é muitas vezes disfarçada em situações contingenciais, fazendo o povo crer que em pouco tempo será superada. Isso ocorre também por falta de informação e por medo de causar comoções populacionais. Pudemos ver isso claramente nos conflitos entre os EUA e o Oriente Médio. Apesar dessa discórdia já ser antiga e guardar grandes proporções, a maioria dos americanos nunca tinha pensado que um atentado como o do “11 de setembro” fosse possível. E depois do ocorrido, o governo dos EUA fez questão de anunciar de várias formas que resolveria esse embate rapidamente, primeiramente com a morte de Bin Laden, depois com uma “guerra relâmpago” no Iraque, e agora, com a morte de Sadan Hussen. Mas há pouco sentimos na pele a perda de um ilustre brasileiro naquela terra (Sérgio Vieira de Mello), o que só nos faz pensar que, até o momento, o tratamento dessa crise foi apenas paliativo.
Como tendências inconscientes “não mais admitidas”, podemos ver o messianismo. Num tempo conflitivo como esse, é difícil evitar o pensamento apocalíptico. No entanto, o avanço crescente da modernização, informatização e secularismo, aliados ao desenvolvimento tecnológico e científico levam a um relativismo na cultura que torna qualquer esperança de solução, de fundo religioso, infantil. Porém, não há como negar a importância do Cristianismo na construção da sociedade ocidental, deixando seus rastros no inconsciente coletivo do mais convicto ateu.
Nesse contexto, a fantasia coletiva foge inevitavelmente para soluções fantásticas, que possam lhe negar a realidade, ou deixá-la menos árida. Para universos onde uma única solução, clara e personificada é possível e suficiente — ao invés da difícil indecisão do processo coletivo. Filmes onde é fácil ver quem são os bons e os maus, e superpoderes tornam a vitória dos bons certa e justa no final. Onde o mágico e o sagrado têm vez, e não são ridicularizados. (Basta vermos o sucesso arrebatador de “Todo Poderoso” e comparar a estrutura do seu enredo com as demandas acima).
Por outro lado, os mitos também auxiliam na caminhada da conscientização dessas tendências, apontando caminhos por onde o novo possa passar. Por esse prisma, vale conferir os temas mitológicos que “The Matrix” traz.
Em BRANDÃO (12), no prefácio do Dr. Vargas temos que: “Sempre que algo novo e transformador vai ser implantado em nossa consciência pessoal e coletiva, algum dinamismo heróico deverá ser ativado”. Constituem processo importante e útil, contanto que nos lembremos que tais arquétipos devem ser “inspiradores e modelos de transformação, e não modelos de identificação” (p. 9 e 11), o que nos levaria a ultrapassar a medida humana (o “métron”). Quando isso ocorre, temos verdadeiros “paranóicos” com delírios de perseguição e grandeza. (Qualquer semelhança com o presidente Bush não é mera coincidência).
Assim, enxergando pelo lado positivo, o filme possui muitos símbolos que apontam para uma transformação do mundo. O número 7, por exemplo, com sua significação de recriação. O próprio nome do protagonista: Neo. Ser uma história heróica, com uma resistência transformadora que parte de Sião = Jerusalém. Até o slogan da webpage americana oficial : “free your mind”, todos são sinais que apontam nessa direção. Além disso, o tema do messianismo abre espaço para o sagrado, pensando uma transformação do mundo onde ele possa estar inserido. E, como a “nova Jerusalém”, aponta para um fim da dominação imperial. No tempo antigo, o Império era o Romano. Hoje, temos o capitalismo, sutilmente criticado no filme, em alguns momentos (min. 11’35 e 42’43), como aquele que desrespeita as singularidades dos indivíduos e os transforma em “batteries” para as suas engrenagens. E nesse âmbito, talvez o filme fale até mesmo do império americano (o sobrenome de Cypher é “Reagan”, que é dito pela boca dos agentes, a quem ele pede para se tornar alguém importante, um ator — 1:03:33, assim como foi o ex-presidente americano de mesmo sobrenome).
A Conclusão
Aqui, em primeiro, é necessário deixar expresso a admiração pelo trabalho dos irmãos Wachowski, roteiristas dessa obra de arte em que se constituiu “The Matrix”. Dentre outras coisas, o conhecimento que eles possuem de mitologia, ao que parece, permitiu que seu filme alcançasse riqueza e complexidade invejáveis, sem perder público por isso. Iniciativas como essa auxiliam o mundo a pensar seu futuro, sem perder contato com o passado, mas ao contrário, confrontando-se com suas origens. E isso se torna imprescindível num momento de crise como o atual. Para que mudanças reais, efetivas e eficazes se realizem, é necessário que uma reflexão profunda da nossa história e dos nossos anseios se concretize, superando o nível da alegoria e a discrepância entre consciente e inconsciente, ajudando-nos a integrar as “tendências inconscientes não reconhecidas e não mais admitidas”, antes que cenas apocalípticas nos peguem desprevenidos em nossa ignorância (novamente). E para tal, as imagens primordiais dos mitos do herói e do messias trazem grande contribuição, sendo fortes símbolos e modelos de transformação. Esperamos que outras obras de arte sejam feitas com esse proveito, ao invés de apenas visarem entretenimento suave e quantias milionárias, visto que poucas produções midiáticas possuem tamanha possibilidade de infiltração mundial. Propondo enigmas mais do que sonhos fabricados, os bens culturais podem aproveitar de forma mais fecunda toda essa identificação do público com esses mitos, nesse cenário de crise. Sendo produtores de discussão e reflexão, existe a possibilidade de que contribuam para o processo de individuação do planeta, ao invés de manter o público preso a uma “Matrix” cinematográfica fantasiosa de negação da realidade, onde multidões mundiais se refugiam para fugir dos conflitos contemporâneos. Dessa maneira, ajudando-nos a que um dia possamos finalmente vislumbrar o mundo transformado, quando a amarga “condenação à liberdade” (16) dará espaço a celebração de uma sociedade nova, de “Liberdade, Diferença e Solidariedade” (p. 254), engrandecida pela conscientização de seus símbolos de transformação.
Referência Bibliográfica
- BRANDÃO, Junito de Souza. Mitologia Grega.Petrópolis: Ed. Vozes, 1984. Vol. I (pp. 25-41).
- SCHWARZ, Fernando. A Tradição e as vias de Conhecimento — Ontem e Hoje. Editora Nova Acrópole.
- JUNG, C. G.. Símbolos da Transformação. Petrópolis: Ed. Vozes, 1973.
- FADIMAN, James & FRAGER, Robert. Teorias da Personalidade. Cap.: C. G. Jung e a Psicologia Analítica. São Paulo: Ed. Harbra ltda., 1986.
- JUNG, C. G.. Fundamentos da Psicologia Analítica — As conferências de Tavistock. Petrópolis: Ed. Vozes, 1972.
- Web site: BBC Brasil.com http://www.bbc.co.uk/portuguese/cultura/030527_matrixfn.shtml
- Web site: Especial Cineinsite do “A TARDE on line” http://www.atarde.com.br/e